Por Maria José de Souza Arakaki (Sócia da Arakaki Advogados)
Não apenas em época de crise econômica, mas principalmente durante ela, a chamada devolução de imóveis como comumente é conhecida ou tecnicamente “rescisão do contrato de compromisso de compra e venda de imóveis” é uma situação normal na área imobiliária/contratual.
O fato é que nos últimos anos o mercado imobiliário deu um grande salto em termos de crescimento, havendo uma inegável valorização dos imóveis, além de existir grande oferta de imóveis para venda e financiamentos acessíveis por prazos de até 30 (trinta) anos.
Assim, houve um tempo próspero para o mercado imobiliário brasileiro, com muitos imóveis novos e outros em fase de construção sendo vendidos a preços compatíveis com a valorização imobiliária, ocasião em que grande parte dos negócios foram celebrados por meio de compromisso de compra e venda de imóvel.
A fim de esclarecer o tema, pertinente se mostra uma breve explicação sobre o que vem a ser um “contrato de compromisso de compra e venda de imóvel”, que em poucas palavras trata-se de um negócio onde o vendedor se compromete a vender o bem imóvel e o comprador se compromete a pagar o preço, normalmente a prazo, sendo que o compromissário vendedor só outorgará a escritura definitiva de compra e venda do imóvel com a quitação total do preço por parte do compromissário comprador.
Ocorre que nem sempre o compromissário comprador consegue arcar com as prestações até o final do contrato e isso pode acontecer por vários motivos inesperados, tais como: uma eventual crise econômica, desemprego, doença, dívida inesperada etc.
Nestes casos, o compromissário comprador pode perder o imóvel pela falta de pagamento ou pode fazer um acordo com o compromissário vendedor que receberá o imóvel e devolverá uma parte dos valores pagos, retendo valores para cobrir custos administrativos com a venda e os prejuízos que teve.
Cumpre lembrar que a lei traz prazos curtos e mecanismos extrajudiciais eficientes na retomada de imóvel comprometido à venda, razão pela qual em caso de dificuldade financeira é aconselhável que o compromissário comprador procure um acordo para a rescisão do compromisso de compra e venda do imóvel ou quando esta não for possível extrajudicialmente, que ingresse com uma ação judicial visando tal finalidade.
Até o momento, não há no ordenamento jurídico brasileiro nenhuma lei que regulamente a situação da “rescisão contratual do compromisso de compra e venda de imóvel”, pairando uma insegurança jurídica sobre como proceder em tais casos, em especial em termos de valores que devem ser devolvidos ao compromissário comprador e os valores que podem ser retidos pelo compromissário vendedor.
Assim, o Governo Federal pretende regulamentar a “rescisão contratual do compromisso de compra e venda de imóveis” para suprir a atual lacuna legal.
Neste sentido, embora já exista o Projeto de Lei nº 774/2015 em tramitação no Senado, poderá o Governo Federal (Poder Executivo) por meio de seu representante, o Presidente da República, editar uma Medida Provisória em razão da urgência de regulamentação da matéria para a atual situação do mercado, que posteriormente deverá ser submetida aos trâmites legislativos para conversão em lei.
Até então, o que se tem visto são os compromissários vendedores oferecem a título de acordo extrajudicial a retenção entre 40% (quarenta por cento) e 60% (sessenta por cento) dos valores pagos e a devolução do valor remanescente. Enquanto os compromissários compradores querem a devolução de 100% (cem por cento) dos valores pagos.
Os Tribunais brasileiros têm se manifestado no sentido de que é justa a retenção de parte dos valores pelo compromissário vendedor, com a devolução da maior parte do que foi pago ao compromissário comprador, sendo que no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a retenção de valores pelo compromissário vendedor tem sido fixada entre 10% (dez por cento) e 20% (vinte por cento) da totalidade dos valores pagos pela aquisição do imóvel, para que este percentual cubra os custos administrativos com a venda e os prejuízos que teve o compromissário vendedor.
Por fim, uma lei que regulamente essa situação e deixe clara a regra a ser aplicada a estes casos, desde que de forma justa para ambas as partes, chegará em boa hora e resolverá muitos conflitos.