A hospedagem de menores de idade e a sua insegurança jurídica

Entenda a polêmica existente na hospedagem de menores de idade e o porquê da atual insegurança jurídica da questão.

Por Murillo Akio Arakaki (Sócio da Arakaki Advogados)

Quais são as exigências para se hospedar menores de idade em seu hotel? Essa é uma pergunta que terão inúmeras respostas por parte dos diferentes estabelecimentos hoteleiros espalhados pelo Brasil. A questão é extremamente delicada e deve ser tratada com muita cautela, pois independentemente do posicionamento adotado pelo hotel, haverá riscos de sofrer com algumas consequências previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Código de Defesa do Consumidor e no Código Civil.

A Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente) proíbe a hospedagem de menores de dezoito anos em hotel, motel, pensão ou estabelecimento congênere, salvo se autorizado pelos pais ou responsável. A lei ainda prevê multa para quem hospedar criança ou adolescente desacompanhado dos pais ou responsável, ou sem autorização escrita desses ou da autoridade judiciária, em hotel, pensão, motel ou congênere [1], podendo a reincidência ser punida com o fechamento do estabelecimento por até 15 dias. Já no caso dessa reincidência ocorrer em período inferior a 30 dias o estabelecimento poderá ser definitivamente fechado e poderá ter sua licença cassada.

Obviamente que a intenção dessa lei é justamente proteger as crianças e os adolescentes das redes de exploração sexual infanto-juvenil, do crime de subtração e de qualquer espécie de violência contra menores de idade.

Ocorre que existe um segundo posicionamento advindo da própria interpretação do Estatuto da Criança e do Adolescente e de uma nota técnica emitida pelo Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente em 26 de maio de 2011. Essa segunda interpretação é no sentido de que a presença de um dos pais é suficiente para que o hotel autorize a hospedagem do menor de idade, baseada na igualdade de condições do exercício do poder familiar entre os pais, conforme artigo 21 do ECA [2].

Por outro lado, existe uma dura crítica a esse posicionamento, haja vista que o ECA não é claramente permissivo sobre a hospedagem de menores apenas com a autorização de um dos pais.

Partindo dessa polêmica, existem hotéis que adotam posicionamentos diferentes para essa mesma questão. Mas afinal, quais são os riscos de cada um deles?

No primeiro deles (hospedar menores somente com autorização expressa de ambos os pais, presencial ou escrita com firma reconhecida), não haverá nenhum problema caso os requisitos legais sejam cumpridos pelo hóspede. O problema está justamente em casos em que o estabelecimento hoteleiro precisa negar a hospedagem pela falta do cumprimento desses mesmos requisitos.

Isso porque, se por um lado a intenção da lei é proteger menores de inúmeros crimes e abusos, por outro ela pode obrigar o hotel a impedir a hospedagem de pais que estejam de boa-fé, frustrando férias e/ou prejudicando eventuais compromissos. O grande problema é esse, pois existem inúmeras ações judiciais de pais que tiverem a hospedagem de seus filhos menores negada por não apresentar autorização expressa do pai ou mãe ausente, buscando uma indenização por danos materiais e morais pela injusta exigência.

Com isso, existem juízes que concordam com os argumentos dos pais e condenam o hotel a indenizar os autores da ação, causando prejuízos ao estabelecimento hoteleiro justamente pela tentativa de cumprir as regras do Estatuto da Criança e do Adolescente. Já houveram casos de condenações mesmo em situações em que o genitor não portava os documentos do menor de idade, ou seja, com essa interpretação legal ambígua, a resposta sobre interpretação a ser adotada ficará a cargo do juiz do caso, podendo então ele seguir um ou outro posicionamento.

O fator que deixa a situação ainda mais delicada são casos em que há disputas de guarda de menores na justiça, pois nelas os pais estão em grande disputa judicial e não raro um dos pais sem a guarda judicial do menor viaja com a criança, de boa ou má-fé. Porém, em razão dos processos tramitarem em segredo de justiça, o hotel não consegue apurar a atual situação da ação judicial de guarda e, logo, fica sem subsídios para aceitar ou negar a hospedagem no momento do check-in com segurança jurídica.

Por fim e em razão da ambiguidade da lei, acredito que o melhor caminho para a máxima segurança jurídica dos hotéis seja a prevenção. É necessário inserir as regras da política de hospedagem de menores no site do estabelecimento hoteleiro e sempre comunicar os hóspedes de forma inequívoca sobre os documentos exigidos antes mesmo do check-in, com a máxima de antecedência possível. Com isso, se evitará muitos transtornos a ambas as partes.

[1] Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Art. 82. É proibida a hospedagem de criança ou adolescente em hotel, motel, pensão ou estabelecimento congênere, salvo se autorizado ou acompanhado pelos pais ou responsável.

(…)

Art. 250. Hospedar criança ou adolescente desacompanhado dos pais ou responsável, ou sem autorização escrita desses ou da autoridade judiciária, em hotel, pensão, motel ou congênere: (Redação dada pela Lei nº 12.038, de 2009).

Pena – multa. (Redação dada pela Lei nº 12.038, de 2009).

§1º Em caso de reincidência, sem prejuízo da pena de multa, a autoridade judiciária poderá determinar o fechamento do estabelecimento por até 15 (quinze) dias. (Incluído pela Lei nº 12.038, de 2009).

§2º Se comprovada a reincidência em período inferior a 30 (trinta) dias, o estabelecimento será definitivamente fechado e terá sua licença cassada. (Incluído pela Lei nº 12.038, de 2009).

[2] Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência.

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